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Quem planta seus medos espanta

Categoria Fé e espiritualidade Luto Reflexão

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Quem planta seus medos espanta

O professor e Terapeuta Mateus Rodrigues, nos presenteou com um rico e significativo relato. A legitimidade de um relato de quem, como cliente, vivenciou e experiência do BioParque, nos orgulha e nos comove.


A palavra “mors”, do latim, se refere ao estado de cessação da vida.

A longo do tempo o fenômeno “morte” foi sendo impregnado de muitos outros sentidos, positivos ou nem tanto.

Como ela é algo mais certo do que uma simples operação matemática, é certo também que, naturalmente, desde os primórdios todos os povos humanos a reconheciam como algo inevitável, por mais que não a pudessem explicar cientificamente.

Ademais, em diversas culturas, esse fenômeno ganhou símbolos e práticas diversas durante a história.

Até mesmo dentro de uma mesma crença, como no Cristianismo, a diversidade na celebração da morte tornou-se aparente entre povos distintos.

Tomando como base o Dia de Finados é surpreendente ver que para alguns esse dia é vivido de forma mais recolhida, em silêncio e oração. Já para outros, como no México, essa data se tornou uma grande festividade. O Dia de los muertos é para os mexicanos uma celebração da vida.

E para você? Qual a visão que tem sobre o fenômeno mais certo de sua vida?

Dias antes de meu pai falecer, estávamos nós internados no hospital. Ele tratando de uma mielodisplasia e eu me preparando para ser seu doador de medula óssea.

No dia 2 de novembro de 2022, Dia de Finados, dentro do próprio hospital onde faríamos os procedimentos, gravei uma reflexão intitulada “Mementos Mori” (“Reflete sobre a morte”). Nela levantei algumas hipóteses sobre o motivo de termos, geralmente, tanto medo desse fenômeno tão certo em nossas vidas.

Medo de sentir alguma dor ou de como ficarão os que estou deixando vivos? Medo de uma nova realidade que acredito existir, de uma Salvação ou perdição eternas? Ou será mesmo que esse medo reside na memória de imagens impressas na mente, como a de “zumbis”, cemitérios ou “mortos-vivos”, vistos em filmes e novelas?

Despretensiosamente publiquei a reflexão no Instagram.

Meu pai e eu estávamos separados de quarto devido à sua baixa imunidade e, quando podíamos nos encontrar, de longe, em nenhum momento ele comentou sobre a reflexão postada, até mesmo porque ele não tinha muito o hábito de navegar em redes sociais.

No dia 16 do mesmo mês ele veio a falecer. A medula já havia dado sinais de “pega”, mas ainda era insuficiente na defesa de seu corpo e um quadro de infecção se instaurou.

No dia do velório, a enfermeira que o acompanhava 24 horas no quarto nos disse: “Ele gravou uma mensagem para vocês no celular”

Nessa mensagem, oito dias antes de partir, meu pai mencionou a reflexão “Mementos Mori” e lembrou da estrofe de uma música que gostava muito: “Por que tenho medo, se nada é impossível para Ti”.

Independente da crença religiosa, vale a reflexão: por que tanto medo? Algum medo relacionado com as hipóteses acima levantadas?

Desde pequenos, passamos a lidar com a experiência da morte de forma bastante natural. Um inseto inerte no chão, uma flor que murcha e cai, um animalzinho de estimação que se vai.

É como se disséssemos que a vida nos dá oportunidades de aprendermos, desde cedo, que o contato com a natureza nos leva a assimilar melhor esse momento do que quando estamos em meio à um lugar acinzentado, carregado de túmulos.

Tenho na memória minha primeira perda marcante, com aproximadamente 10 anos: “Filho, o Vô Chiquito morreu”.

E do que me lembro desse dia? Um lindo dia de sol, em meio à uma vegetação densa, em frente à uma lagoa. Uma bela memória para um momento como esse, não?

Inevitavelmente, outras perdas vieram ao longo de minha vida. No início, confesso, que não me agradava nem um pouco poder ir a um cemitério convencional. No dia em que meu avô faleceu estava em um clube com um amigo e sua família. Lembro-me de ter recusado a ida ao cemitério.

Normal para uma criança. Mas, ainda sim, esse medo permaneceu por algum tempo.

O tempo passou e com a partida de meu pai tivemos o privilégio (sim, privilégio!) de oferecer não só a ele uma homenagem “não convencional”, mas aos amigos e parentes a oportunidade de viver o início de um luto plantando uma árvore.

Um velório, reconhecendo uma perda, uma cremação, pra enxergar que um dia o corpo findará, o plantio de sementes como forma de construir um “novo túmulo”, um memorial vivo que permite a recordação de belos momentos.

E foi assim.

Atrelado a vida honrosa que meu pai viveu, a experiência vivida em cada uma das etapas no BioParque permitiu com que disséssemos em família: “Quem planta seus medos espanta”.

Mas sabemos que as notícias que recebemos de uma perda são das mais variadas: impactantes, serenas, rápidas ou rodeadas de uma preparação. Os lugares também. A notícia chega quando estamos em casa, no trânsito, no hospital, do outro lado do mundo ou em um belo espaço arborizado.

De uma forma ou de outra, seja como for, nossas vidas são marcadas.

A própria perda já nos imprime marcas inigualáveis, especialmente quando aquele que se vai já tenha registrado em nós uma “tatuagem”: a de um grande amor, uma inscrição de eternidade.

E que tudo isso faz parte da vida, nós já sabemos. O problema é que ela, sem manual de instruções, nos surpreende, mesmo quando já aguardávamos por uma perda.

Por vezes ela nos deixa espantados, desesperados, pois o medo do novo se apresenta diante de nós. O tempo de romper chega e não há o que fazer, senão, reconhecê-lo e vivê-lo.

E então, nos muitos estágios desse processo de luto várias experiências surgem.

A própria negação desse tempo é real e muito comum. Mas plantando os pés na realidade temos a oportunidade de fixar nosso imaginário naquilo que há de mais concreto e não no medo daquilo que pode vir.

Por isso, experiências como a de dar vida àquilo que já está inerte, pode ser um bom caminho para ressignificar um momento tão doloroso que nos apresenta.

O simbolismo do nascimento de um novo ser, desde sua germinação até seu cultivo no solo nos ajuda a lembrar e viver o momento de luto com mais esperança.

Nos dá a oportunidade de enxergar que para além da finitude da vida há uma dimensão muito maior, da existência à transcendência!

Quem planta não só os medos espanta, mas as dores acalenta e a alma, encanta!


 

Mateus Rodrigues Silva

Professor de Biologia e Terapeuta

Instagram: @mateus_bio

Marketplace (contato): https://marketplace.certificacaoitalomarsili.com.br/1477/crcim16447291-mateus-rodrigues-silva

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